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Um único senador controla verba maior que o orçamento de 44% dos municípios


Um levantamento feito pela Folha de S.Paulo revela que um único senador tem em mãos, por meio de emendas parlamentares, um valor maior que o orçamento de 44% dos municípios brasileiros. Já cada deputado federal controla recursos superiores ao orçamento de 14% das cidades, de acordo com projeções para 2025.

O estudo mostra como a concentração de poder e recursos no Congresso cresceu nos últimos anos, após a expansão das emendas individuais. Atualmente, cada senador dispõe de R$ 68,5 milhões, enquanto cada deputado tem ao menos R$ 37,1 milhões para direcionar investimentos em suas bases. Metade dessas verbas deve obrigatoriamente ser aplicada na saúde, e sua execução pelo Executivo é compulsória.

Em julho, a Câmara decidiu aumentar ainda mais os valores de cada deputado, adicionando R$ 11 milhões em emendas de comissão, elevando o montante potencial para R$ 48,1 milhões — valor superior ao orçamento de 27% das cidades brasileiras. A cifra não inclui as emendas de bancada, que seguem sendo distribuídas individualmente, apesar de uma decisão do STF que previa regras coletivas.

Poder concentrado e influência política

Para especialistas, o cenário revela que parlamentares passaram a atuar como “ordenadores de despesas”, com capacidade de distribuir recursos de forma mais poderosa que ministros, governadores e até prefeitos. Segundo Élida Graziane, professora da FGV, “é como se cada parlamentar tivesse um feudo fiscal para chamar de seu”, capaz de influenciar diretamente políticas locais e eleições.

Dados por estado mostram que, em alguns casos, o valor de um senador supera o orçamento de 80% dos municípios do Tocantins e cerca de 60% no Rio Grande do Sul, Rio Grande do Norte e Piauí. Entre os deputados, a verba supera 22% das cidades de Santa Catarina e 33% das do Amapá. Quase todos os municípios impactados têm menos de 20 mil habitantes.

Expansão acelerada

Até 2022, os valores de emendas individuais variavam entre R$ 15 milhões e R$ 17 milhões por parlamentar. A partir daquele ano, mudanças no Orçamento elevaram os limites: em 2023, os senadores passaram a ter cerca de R$ 59 milhões e os deputados R$ 32 milhões, chegando aos montantes atuais.

Com a expansão, os ministérios passaram a procurar o Congresso para distribuir recursos, entregando “cardápios” de programas que precisam de emendas, invertendo a lógica anterior em que os parlamentares pediam a liberação. Apesar do aumento dos recursos, critérios de transparência continuam limitados: em 2023, apenas 16 congressistas adotaram regras públicas para a aplicação das verbas.

A pesquisadora Beatriz Any, da USP, defende a regulação do sistema, com limites de valores, fim das emendas coletivas e revisão da obrigatoriedade de pagamento pelo Executivo, atualmente objeto de análise no STF. Segundo ela, o controle das emendas acabou ficando a cargo do Judiciário, lembrando casos antigos de desvio, como o escândalo dos “anões do orçamento” de 1993.




Por Ataíde Barbosa/Foto: Andressa Anholete / Agência Senado

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